Texto de Natasha Barbosa
Arte de Bruno Capilé
O Morro da Babilônia está localizado no bairro do Leme na cidade do Rio de Janeiro. Este morro, junto ao do Leme e do Urubu, se encontra ao sul da Urca, do lado ocidental da entrada da Baía de Guanabara. Desde o século XVIII, grande parte de seu perímetro compõe espaço militar protetivo, que contou com a construção de baterias e fortificações, para impedir invasões à cidade. O nome do morro, dizem alguns, faz referências aos Jardins Suspenso da Babilônia, umas das sete maravilhas do mundo antigo, hipótese verificável para quem sobe suas ladeiras pelo meio da mata e aprecia a beleza vista de seu cume.
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Forte do Leme, localizado na Ladeira do Leme, renomeada como rua Coelho Cinta. Continua a ser conexão ao bairro de Botafogo. Ilustração do Forte do Leme em 1818. Fonte: Reproduzido na Revista Brazil Illustrado Anno1, n.2, p. 21, 1918. Imagem atual do Google Street View.
O morro abriga duas favelas com períodos distintos de formação: o Morro da Babilônia e o Chapéu Mangueira. Podemos tomar o começo do século XX como marco da identificação do morro como favela, posto em descompasso a cidade moderna que se pretendia com a grande reforma urbana daquele momento. Caracterizações depreciativas quanto ao espaço, aos tipos de moradia e aos moradores, bem como a destruição da floresta que guarnecia o morro, foram elencados ao longo do tempo para reforçar para justificar uma série de medidas a “problemática das favelas” na cidade.
Este cenário apresenta algumas mudanças nos anos de 1980 com a implementação de projetos de melhorias estruturais em favelas cariocas, como os projetos mutirões, em instância municipal e estadual. Essas frentes de trabalho eram financiadas pelo poder público e executadas em grande parte pelos moradores das favelas atendidas.
O Mutirão Reflorestamento, projeto de iniciativa municipal, foi criado na cidade do Rio de Janeiro, em 1986, como um incremento destes projetos de melhorias estruturais, dentre seus objetivos estavam a recuperação vegetal das encostas e o controle da expansão das favelas na cidade. O reflorestamento chegou ao Morro da Babilônia em 1995 após tragédias recorrentes envolvendo deslizamentos de terras, em períodos chuvosos, e incêndios nas épocas de seca, com a queima do capim colonião que ocupou rapidamente as áreas que anteriormente abrigavam floresta de mata atlântica.
Mutirantes do projeto Mutirão Reflorestamento, no setor de trabalho Lauro Muller, 2004. Fonte: Acervo CoopBabilônia.
A base de execução dos projetos mutirões é a participação dos moradores das localidades atendidas, e não foi diferente na execução do projeto de reflorestamento. A associação de moradores pode requerer o projeto, ou este ser indicado por órgão público. O Mutirão Reflorestamento se propôs a recomposição vegetal de encostas para diminuir riscos erosivos, promover amenização climática e recomposição da biodiversidade local, auxiliar a contenção de expansão de áreas de favelas pelos morros da cidade, e também ser fonte de renda aos seus moradores.
O processo de recuperação da floresta do Morro da Babilônia ocorreu concomitantemente a outros projetos na região que possuíam o mesmo intuito, e foram elaborados por associações de moradores do bairro em parceria com a Fundação Parque e Jardins da Prefeitura do Rio de Janeiro.
Em 2001 se iniciou o período de manutenção do plantio do reflorestamento, a partir deste momento, a cargo da Cooperativa de Trabalhadores em Reflorestamento e Prestação de Serviços da Babilônia Ltda., CoopBabilônia, formada e gerida pelos moradores da favela que integraram como mutirantes reflorestadores o projeto Mutirão Reflorestamento, contando também com parceria e incentivos privados.
Antes e depois, face norte, Morro da Babilônia e Morro do Urubu. Foto 1, 1989, Foto 2, 2008. Fonte: Acervo CoopBabilônia.
Em 2019 o projeto completou 33 anos de atuação com mais de 10 milhões de mudas em 3,4 mil hectares de áreas plantadas em morros e encostas de 92 bairros da cidade do Rio de Janeiro [1]. A favela do Morro da Babilônia é exemplo de organização comunitária, negociação e lutas pela cidade, e realização de uma iniciativa que reconhece e valoriza a parceria do poder público com a sociedade de maneira promissora em diálogo com a natureza na cidade.
Histórico da formação das unidades de conservação, 24 de abril de 2019. Fonte: CoopBabilônia.
Para saber mais
Barbosa, Natasha Augusto. Os jardins suspensos do Morro da Babilônia: o mutirão reflorestamento na perspectiva da história ambiental urbana (1985-2015)130 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de História, Programa de Pós-Graduação em História Social, 2020.
Agradecimentos aos cooperados da CoopBabilônia, moradores e moradoras das favelas do Morro da Babilônia e Chapéu Mangueira, representados aqui por Carlos Antônio Pereira e Nilson Celestino Assunção. Além dos apoiadores do reflorestamento do morro e imediações, Plínio Loures Senna e Abílio Valério Tozzini. Agradeço ainda aos técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, Cláudia Ribeiro França, Eremita Medeiros dos Santos, Celso Junius Ferreira Santos e Luiz Carlos Pereira Lourenço.
Esta pesquisa integra o projeto Ocuppy Climate Change (OCC!) com colaboração do LabHeN UFRJ. Seu objetivo é a investigação de práticas auto organizadas locais sobre o impacto das mudanças climáticas no ambiente urbano, coordenado pelo KTH Environmental Humanities Laboratory, financiado pela agência FORMAS.